quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Eu tenho vergonha do Silas Malafaia!


Acabei de ver outro vídeo do Silas Malafaia no qual aparece convidando seus ouvintes a não votarem em Ciro Gomes. Com a impetuosidade de sempre, esbravejou acusações ao presidenciável afirmando ter ele "DNA esquerdopata", favorecido empresas quando governador para receber milhões, ser “desequilibrado”, promovedor de violência contra mulheres e amigo de corrupto por tentar visitar Lula na prisão. Não quero entrar nos méritos de suas acusações, especialmente em relação ao favorecimento de empresas no Ceará. Provavelmente, Silas tenha provas e poderá defender tal afirmação caso seja requerido em júri, pois falso testemunho, além de pecado, é crime. Na verdade, o que me intriga são suas constantes incoerências. Em certo momento, ele aparece afirmando que Bolsonaro não teria qualquer condição de ser presidente (está gravado em vídeo) e, um ano depois, Malafaia surge nas mesmas mídias com outra ideia e, como se nada tivesse dito antes, usando igual força (para não dizer estupidez), sarcasmo e gritos em apoio ao mesmo presidenciável. Como ele consegue acusar Ciro de usar palavras machistas e ser desequilibrado e, ao mesmo tempo, fazer campanha a alguém marcado exatamente por essas características?

Repito, não pretendo discutir aqui se o presidenciável acusado pelo pastor midiático é ou não boa opção de voto. Na verdade, incomoda ouvi-lo falando com tanta certeza e convicção a respeito de temas momentaneamente geradores de favorecimento pessoal e, em pouco tempo, encontrá-lo com a mesma certeza dizendo coisas tão diferentes. Ele grita contra os corruptos e seus colegas infames e depois me aparece convidando Pesão, parceiro e beneficiado de Sérgio Cabral, a subir no púlpito da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. A cena do Silas dando o microfone ao Pesão no culto é no mínimo um sacrilégio.

No show infindável de lambanças, por várias vezes Silas declarou amizade com Eduardo Cunha (condenado por corrupção) e afirmou ser ele um político de bem, da fé e enviado de Deus para a presidência da Câmara. Isso seria cômico se não fosse deplorável!

No mesmo nível de bestialidade e incoerência, Silas apareceu publicamente criticando e acusando Crivella e sua Igreja e, pouco tempo depois, o mesmo Crivella recebeu dele indicação de voto e elogios por conta de sua capacidade e grandeza política.

Como interpretar as malafalianas declarações em relação a Eduardo Paes? Silas, como todos sabem, sempre esbravejou que evangélicos não podem se aliar ou legitimar políticos que beneficiem, incentivem ou promovam qualquer coisa relacionada à agenda LGBTT. No entanto, quando Eduardo Paes apoiou a Parada do Orgulho LGBT, o mesmo Silas Malafaia fez um discurso abertamente democrático afirmando ser o então prefeito do RJ líder para todos e não somente dos princípios cristãos. Teria ele vivido um surto irruptivo de cidadania? Acho que não. Desconfio que a “doença” seja outra.

Além de me entristecer observá-lo levando de um lado para outro irmãos e irmãs sujeitos aos seus vaivéns discursivos, morro de vergonha porque Malafaia é acolhido e visibilizado como pastor e, mesmo não querendo admitir, é um colega de vocação.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Em quem votar para Presidente da República?


Qual o modelo deveria ser a régua para nossa avaliação na escolha do presidente do Brasil? Antes, permitam-me indicar um detalhe. Descriminalização do aborto, liberação das drogas, casamento entre pessoas do mesmo sexo e outros pontos tão caros para muitos dos evangélicos que falam em defesa da família e bons costumes não são assuntos a respeito dos quais o presidente da república tenha decisão prioritária ou possa impor sobre uma nação. Esses temas são geridos em outras instâncias. Por isso, meus apontamentos estão relacionados ao papel do chefe de governo. Sob sua competência está a administração federal, criação de políticas públicas, programas governamentais, etc. Como Chefe de Estado, o presidente é o representante internacional de uma nação, função importantíssima que exige diversas estratégias e sabres.

A partir disso, o Presidente da República, em minha opinião, deve ter estas características:

1. Aptidão comprovável para administrar um país, o que exige, no mínimo, conhecimentos básicos a respeito da nação e seus dilemas sócio-políticos;

2. Um bom histórico na política: quais projetos aprovados? Como foram seus votos enquanto parlamentar? Quais foram seus planos de governo ou a quais se aliou? Como foi sua atuação em ministérios ou outros cargos públicos? Algumas das perguntas só poderão ser respondidas caso tenha experiência política ou em qualquer cargo público;

3. Não esteja envolvido com nenhum esquema de corrupção, não tenha se aliado a ninguém envolvido em estratégias ilegais ou legalmente imorais. Não ter sua campanha dependente de nenhuma grande corporação ou setor privado e, também, não deve estar vinculado a nenhuma bancada ou frente parlamentar devedora ou defensora de interesses particulares ou suspeitos;

4. Tenha projetos realmente aplicáveis, saiba de políticas públicas, especialmente para alcançar às pessoas mais frágeis. O candidato precisa ter maior sensibilidade à pobreza, fome, desemprego, etc. e apresentar claramente como desenvolverá ações a curto e longo prazo em benefício dos cidadãos mais empobrecidos e em situação de exclusão social;

5. Possua conhecimento do funcionamento político, da economia brasileira e tenha coragem para fazer as reformas necessárias: tributária, política, previdenciária (não aquela prevista pelo Temer) e agrária;

6. Defenda o Estado Democrático e proponha políticas maduras de preservação de direitos e restrinja sua violação.

8. E, por fim, tenha condições para representação internacional, sabendo cumprir acordos, desenvolvendo autonomia para negociação, não se submetendo a interesses internacionais a ponto de ferir os nacionais e seja uma figura minimamente aberta e preparada para o diálogo com o mundo.

Com esses indicativos posso avaliar os pontos fracos ou fortes do presidenciável em quem votarei. Caso faltem-lhe muitos desses indícios, preciso repensar com calma a quem dispensarei minha confiança ou defenderei em espaços públicos.

sábado, 1 de setembro de 2018

Por que um cristão, especialmente evangélico, não deveria votar em Jair Bolsonaro?


Por que um cristão, especialmente evangélico, não deveria votar em Jair Bolsonaro?
O post pretende apresentar apontamentos diretos e objetivos com o intuito de ajudar na reflexão. Algumas explicações: a. são razões a partir do lugar da fé evangélica; b. não indico qualquer candidato/a específico/a, mas desestimulo o voto ao citado presidenciável. Ou seja, a ponderação é sobre em quem, entendo, NÃO deveríamos votar.
Comecemos:
1. A tradição protestante é historicamente ligada à formação do Estado Democrático de Direito. Para o surgimento da Modernidade, entre tantas outras coisas, a Reforma e seus desdobramentos foram fundamentais. Por isso, quaisquer discurso ou propostas políticas que insinuem perda de liberdade democrática, como ditaduras ou sistemas autocráticos, são totalmente contrários ao espírito da Reforma ou princípio protestante. Logo, as falas, honrarias a regimes e alguns personagens exaltados por Bolsonaro ferem a história do Protestantismo. Ainda nesse ponto, a maneira como o deputado, mesmo não sendo evangélico, pronuncia-se em relação a posições morais e religiosas sob as quais o seu governo se pautará, também, fere a separação radical entre Igreja e Estado como defendida historicamente pela tradição protestante. A eficiência de um político cristão, nesse sentido, não pode ser medida segundo sua defesa ou não de pontos como direitos homoafetivos, descriminalização do aborto ou qualquer outra questão de disputa na arena pública, mas à luz da sua capacidade de liderar com justiça, sabedoria, solidarização dos acessos e inteligência econômico-política, representando o povo e cumprindo sua obrigação nos limites do cargo (não há na democracia lugar messiânico, mas funções no Estado Democrático de Direito) para o bem comum e não em favor de um grupo específico – a igreja não precisa das benesses do Estado para sua sobrevivência. Cuidado: não podemos esquecer, ao discutirmos sobre família etc., que a Bíblia nunca exortou a respeito da falta de auxílio governamental para sua presença testemunhal no mundo, mas denuncia a respeito da mudança “para outro evangelho” (Gl 1.7).
2. Seguindo, não seria recomendável votar no presidenciável citado porque defende, mesmo indicando trâmites na distribuição, o armamento da população. A fé cristã não é compatível ao uso de armas de fogo geradoras de morte. Não cremos que seja a violência o caminho rumo à proteção do cidadão e para a paz social. O uso de armas significa a aplicação de violência em casos de conflitos e descontrole emocional. O armamento, e tudo o que ele representa, é radicalmente contrário à proposta do Evangelho. Mt 5.9 diz serem bem-aventurados os pacificadores.
3. A Bíblia mostra-nos em diversos pontos que a principal lei é o amor, o qual não está desassociado da justiça. Isso delimita as fronteiras da interpretação do cristão em relação ao seu voto. Bolsonaro tem uma postura extremamente violenta e seus discursos são, no mínimo, contrários às orientações cristãs. Por várias vezes, mostrou-se violento em relação às mulheres, homossexuais e outras minorias. Para quem já acompanhou pastoralmente pessoas homoafetivas sabe que respostas como “ter filho gay é falta de porrada”, usada por Bolsonaro, representam total desconhecimento. E, além disso, revela insensibilidade às famílias e pessoas com as quais caminhamos em nossas comunidades. Falas como essas representam, sim!, posturas homofóbicas. Mesmo os que discordam das práticas homossexuais devem, no mínimo, escandalizar-se com esse tipo de pronunciamento. O presidente sob o paradigma do Estado Democrático de Direito precisa governar para todos e lhes garantir seus direitos – esse princípio é profundamente protestante/evangélico.
              3.1. Ao lembrar as memórias de figuras como Ustra, o candidato filia seu discurso a pessoas que usaram a morte e tortura como meios de aplicação da justiça. Isso demonstra total incompatibilidade com as intuições do Evangelho. Ainda, a justiça e a equidade são dois princípios fundamentais no horizonte delineado por Jesus. Conseguintemente, uma nação que estatisticamente tem alto índice de violência doméstica, feminicídio, assassinato de homens e mulheres por causa de sua orientação sexual, onde o racismo não está erradicado, a pobreza é fruto de profunda injustiça e em um país cuja distribuição (renda, terra, moradia) é pecaminosamente desleal, as falas do candidato mostram-se insensíveis e, por vezes, legitimadoras. Observando os profetas do AT e as escolhas de Jesus, percebemos o gritante descompasso entre as perspectivas do presidenciável aqui citado e a fé cristã. Além disso, o Evangelho mostra-se como defensor da vida e é base, mesmo que indiretamente, para diversas proteções individuais previstas entre os Direitos Humanos. Por isso, não podemos compactuar com qualquer candidato que carregue ideias de morte ou punição fatal. Assim, precisamos avaliar e escolher pelo/a candidato/a com propostas de políticas públicas razoáveis para a segurança (superando à ideia superficial e pecaminosa de morte), o que significaria agir contra o pecado das estruturas. Não é compatível ao seguidor de Cristo achar normal um candidato usar as expressões e posturas violentas como as instrumentalizadas pelo deputado Bolsonaro e continuar tendo-o como opção.
                   3.2. A teologia da graça permite pensarmos uma sociedade vinculada a relações não somente meritórias, mas vislumbra horizonte nos quais terra, casa, saúde, educação e outros direitos são partilhados aos incapazes, ou seja, aos brasileiros/as sem “méritos” econômicos. Qualquer projeto político estabelecido sob bases não comunitárias e “graciosas” será anticristão.
4. Não podemos votar em candidatos com indícios de problemas éticos. Mesmo defendido por seus seguidores como político honesto e irrepreensível, suas relações com políticos marcados pela corrupção (Cunha e outros), o uso (“para comer gente” – palavras dele) do auxílio moradia e a possível utilização de assessoria fantasma balançam essa certeza e deveriam gerar desconfiança e crítica nos seguidores de Jesus. Além disso, percebemos nos pronunciamentos do candidato mudanças substanciais, beirando a instabilidade ou falta de consistência. Em relação aos poucos pontos econômicos e políticos por ele defendidos, notoriamente aparenta falta de coerência.
5. A Bíblia fala em governantes sábios, os quais possam liderar com temor e capacidade. Bolsonaro, mesmo depois de 27 anos na câmara, não se informou das questões básicas relacionadas à economia, desenvolvimento, dinâmica do sistema de governos etc. Ele representa o despreparo e a total falta de saber em relação aos pontos essenciais do funcionamento político-econômico do país. Mesmo com anos de mandato não demonstrou qualquer relevância. Por isso, as incapacidades teóricas e práticas desqualificam-no como possível governante à luz das expectativas bíblicas.
               5.1 Seus votos como deputado também denunciam claro despreparo e falta de consistência: votou contra o plano real, contra o projeto de proibição de nepotismo no setor público, votou contra o projeto de teto salarial no setor público, votou contra o projeto para o fim da aposentadoria especial dos senadores e deputados, votou contra o projeto que daria fim à pensão para filhos de militares, votou contra o fundo de combate à pobreza e a favor do aumento do salário dos deputados e senadores. Sobre essa história parlamentar se estabelece o perfil político desse presidenciável e, naturalmente, impede a escolha dos seguidores do Cristo por esse tipo de político.
Assim, à luz dos argumentos acima, sinto-me, como seguidor do Evangelho e pastor, impossibilitado de votar em Jair Bolsonaro.