segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Mentiras, fanatismo, teoria da conspiração e Amazônia



Não importa em quem você tenha votado. A discussão em torno dos desmatamentos na Amazônia e o caos nas relações internacionais é de interesse de todos os brasileiros/as. É verdade, a destruição ambiental sempre ocorreu. Na Europa, pós Revolução Industrial, o uso indiscriminado dos bens naturais exigiu anos de políticas e programas sustentáveis, sérios e duradouros, porque, com atraso, mas em tempo, os amigos do antigo continente perceberam a indispensável relação entre progresso e sustentabilidade. Entre suas ações, as relações econômicas internacionais desde então levam em consideração a “limpeza” dos produtos consumidos. Por isso, a preocupação atual não representa simplesmente melindre de fanáticos ambientalistas, mas é a postura do mercado internacional. Pelo contrário, o abuso e fanatismo tornaram-se modus operandi, na verdade, dos nossos ministros e do próprio presidente.

Intoxicado por um tipo de ideologia de extrema-direita, por vezes difícil de categorizar no espectro político, Bolsonaro desde a campanha faz afirmações sem qualquer dado científico e eivadas de teorias da conspiração da época em que os militares governavam o Brasil. Como candidato, várias vezes insinuou que acabaria com a suposta máfia do IBAMA, enfrentaria os xiitas ambientalistas, permitiria o avanço do “progresso” em regiões protegidas e tornou, em seu discurso populista e sem qualquer conhecimento de causa ou provas, a discussão sobre meio-ambiente assunto de “comunistas e esquerdistas que querem acabar com a família”. Para termos ideia, em 2018 somente 5% (!) das multas foram quitadas - o que era frágil ficou pior! Já como presidente eleito, de mãos dadas com o ministro do Meio Ambiente, continuou sua guerra ideológica contra a “chaga ambientalista”. Cortou 50% do orçamento do Prevfogo e criou um núcleo de conciliação para anistiar multas ambientais.

Ainda, o chefe de estado chamou de mentirosos os dados do INPE, desmoralizou os cientistas responsáveis pela análise científica dos desmatamentos e focos de queimadas, novamente afirmou que acabaria com a festa das multas ambientais, ou seja, tratou as instituições de fiscalização e proteção como maus brasileiros. Com esse apoio irrestrito e descarado aos devastadores e criminosos, tratados por Bolsonaro como trabalhadores que desejam o progresso nacional, ruralistas, fazendeiros e madeireiras triplicaram suas invasões, tomadas de terra, queimadas e avanços a regiões de preservação e terras indígenas demarcadas. Ocorreu no Pará, região com altíssimo índice de desmatamento e queimadas de áreas de preservação, onde empresas derrubam a mata e transportam sua madeira criminosamente, o “Dia do Fogo”, em nome do apoio do presidente e confirmação da atual política ambiental. Em resposta e durante esse caos, o governo disparou várias afirmações inconsequentes. Acusou as ONGs pelas queimadas, mentiu sobre o trato ambiental na Alemanha, publicou fake news a respeito da Noruega, desdenhou sua fundamental ajuda financeira e trouxe de volta a velha teoria da Ditadura Militar de que índios, ONGs e países internacionais estão em conluio para tomar a Amazônia do Brasil. O resultado: crise nas relações internacionais, desespero nacional e risco gravíssimo de embargo econômico. E não pensem que tal quadro é simplesmente por conta de “revanchinha” europeia. O calculo é bem simples: negociar com gente como Bolsonaro é ser incoerente com ações ambientais em seus próprios países, fortalece empresas irresponsáveis, algumas delas instaladas aqui no Brasil, e colocam em risco seus próprios investimentos.

Não somos bons de memória, mas na época do Regime Militar foi exatamente o lema “integrar para não entregar” a grande desculpa e o discurso legitimador para eliminar tribos indígenas, arrancar suas terras e apoiar empresas que, sem qualquer fiscalização ou limites, entravam mata adentro destruindo tudo em nome da “soberania nacional”. Em certo nível, o envio de militares para a Amazônia é uma ação desesperada e só reafirma o desqualificado trato do atual governo com o assunto. O caminho é outro. Antes de apagar o fogo, precisa prevê-lo com inteligência. Assim, o cuidado com a biodiversidade amazônica e seu gigantesco bem-natural se constrói em parceria com os Estados localizados nas regiões protegidas, especialmente fortalecendo as instituições de fiscalização e levando a sério os dados do INPE, tanto os diários quanto anuais. É fundamental dialogar com respeito e usar bem os recursos internacionais, projetando avanços sustentáveis e responsáveis nas regiões amazônicas, o que gerará emprego e preservação. Não adiante se esconder em retórica, o governo deve retomar os valores cortados do IBAMA e Ministério do Meio Ambiente e, claro, demitir o atual ministro, mostrando claramente sua total intolerância, com ações e discurso, aos avanços criminosos sobre as terras indígenas e áreas de preservação. E, imediatamente, parar de mentir e desmontar os movimentos ambientalistas e cientistas responsáveis por esse tema tão fundamental. Ou seja, as políticas ambientais brasileiras precisam mudar completamente!

Por fim, nós, igreja e lideranças, especialmente os de perto, precisamos imediatamente de senso crítico e posicionamento profético. Nossa tradição e teologia nos dão tantos instrumentos que qualquer omissão neste momento significaria negar o evangelho diante do mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário